Por Dilmar Ferreira *

Os jornais que circularam no dia 31 de março de 1964 mostram que naquele dia o presidente João Goulart governava o Brasil e falava até mesmo na troca de ministro para poder pacificar o pais. Na foto acima é possível ver a data do jornal Tribuna da Imprensa, do Rio de Janeiro que mostrava que a crise já era generalizada, mas em nenhum dos jornais que circularam naquele dia fez qualquer tipo de menção a golpe militar. De fato, no dia 31 de março, as principais capitais brasileiras e principalmente Brasília, a temperatura política apontava para uma profunda crise política que poderia terminar com uma espécie de levante das forças armadas, em especial dos comandantes do Exército. No Congresso Nacional, a situação era tensa e os governistas perdidos no meio de uma instabilidade política sem precedente na história, mas longe ainda em falar em golpe, mesmo porque bem ou mal as instituições funcionavam na capital e no resto do `Pais, porém os golpistas agiam freneticamente para derrubar o governo.

O sinal verde para o golpe de 1964 foi dado diretamente da Casa Branca (EUA) através do presidente Kennedy, que muitos brasileiros o idolatram como se fosse um grande estadistas da Humanidade, no entanto para o Brasil, provocou uma grande ruptura democrática. O mundo vivia no auge da guerra fria entre Estados Unidos e URSS (sob o comando da Rússia). No Brasil, o presidente João Goulart (PTB) preparava para anunciar medidas estruturais para resgatar o pais da miséria, principalmente no campo. Anunciava uma profunda reforma agrária com indenização dos latifúndios improdutivos aos seus proprietários para doar aos agricultores que já trabalhavam nas terras, aumentando assim a produção de alimentos. Dentre as reformas anunciadas por Jango, as principais seriam essas.

a) Reforma Agrária – Desapropriação do Latifúndio, mediante indenização com títulos da dívida pública, com distribuição para os camponeses sem terra ou com pouca terra (minifúndios).
b) Reforma Bancária – Para concessão de crédito aos pequenos produtores rurais e urbanos, visando ao seu crescimento econômico. O eixo seriam os bancos estatais.
c) Reforma Urbana – Regulamentação do uso e da posse do solo urbano, para desenvolvimento organizado das cidades, garantindo moradia digna para todas as famílias.
d) Reforma Educacional – Valorização do Ensino Público e Gratuito, do Magistério, abolição da cátedra vitalícia nas universidades. Combate ao analfabetismo, utilizando-se o método Paulo Freire.
e) Reforma Fiscal – Promoção da justiça fiscal, com tributação progressiva e taxação das grandes fortunas. Algumas dessas medidas foram adotadas pelos militares e depois pelos governos democráticos como Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.

A Marcha da Família de março de 1964 foi a primeira versão dos recentes movimentos pedindo intervenção militar.

A origem das marchas foi a Cruzada do Rosário, que, sob o pretexto de homenagear a Virgem Maria e rezar o terço em família, tratava-se de propaganda ideológica convencendo o povo de que os que defendiam a reforma eram comunistas e ateus, que queriam destruir a religião.a família e os costumes do povo brasileiro. Tudo isso aconteceu logo após o comício do dia 13 de março na Central do Brasil.

O idealizador da Cruzada foi um empresário estadunidense, multimilionário, Peter Grace (foto acima), interessado em investir na América “espanhola”. Ele conseguiu financiamento da CIA para o trabalho a ser desenvolvido pelo padre irlandês Patrick Peyton, chamado padre de Hollywood. A campanha envolveu muito dinheiro no Chile, Venezuela, Colômbia, e terminaria em Bogotá, quando, em 1962, o Departamento de Estado dos EUA, com o aval direto do presidente John Kennedy, imprime mudança de rota com sua vinda para o Brasil, onde deveria priorizar Rio de Janeiro e Recife, conforme relata o historiador brasileiro José Levino.

Foi em uma audiência do então embaixador dos EUA no Brasil Lincoln Gordon com o presidente John Kennedy em 1961, que iniciaram-se os preparativos para o golpe que culminou em 1964

Na audiência com JFK, o embaixador brasileiro L. Gordon pediu a nomeação do Coronel Vernon A. Walters (3 de janeiro de 1917 – 10 de fevereiro de 2002) como adido militar na embaixada brasileira. A justificativa era de que Vernon (foto à esquerda) conhecera muitos militares brasileiros quando serviu na Segunda Guerra, entre eles o Marechal Humberto Castelo Branco, que por isso mesmo viria ser nomeado primeiro presidente do período militar do Brasil.

Castelo Branco não era um militar da vanguarda do Exército, mas como era velho conhecido do Coronel Vernon A. Walters (foto à direita) quando ambos serviram na Segunda Guerra Mundial, na Itália, o militar brasileiro conquistou a confiança dos Estados Unidos para ocupar o cargo de presidente do Brasil com a finalidade de fazer um limpa na política brasileira, acabando com o perigo do comunismo do pais.

Castelo Branco defendia a tese de que a intervenção militar deveria ser breve e passageira, mas recebia uma oposição muito grande no seio das Forças Armadas, onde os militares queriam ficar mais tempo no poder. O partido do Governo, a Arena, também defendia no Congresso Nacional a permanência dos militares e assim as eleições indiretas. A linha dura comandada pelo então Marechal Costa e Silva saiu vencedora e assumiu o comando do Governo.

Para endurecer ainda mais o regime, os militares, aproveitando uma doença de Costa e Silva, criaram um triunvirato dentro do próprio governo, editando assim o famigerado AI-5 (13 de dezembro de 1968), suspendendo todas as garantias individuais e fomentando uma série de cassações de políticos por todo o Brasil. Assim, o golpe militar chegou com sua mão forte e impiedosa em Goiás, inclusive com a cassação do então prefeito de Goiânia, Iris Rezende Machado e pré candidato ao governo do Estado.

Não podemos jamais parar de contar e relembrar os fatos e os acontecimentos que antecederam o golpe de 64 e os crimes praticados pelos regime estabelecido no Brasil a partir daquele levante praticado pelos civis, mas ocupado pelos militares com as bênçãos dos Estados Unidos, que se gabam de ser o país mais democrático do mundo.

Dilmar Ferreira *

Jornalista, professor, historiador e pesquisador

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *