Decisão da corte americana repercute no Brasil, uma vez que o artigo 19 do Marco Civil da Internet, que trata do mesmo tema, terá a constitucionalidade avaliada pelo Superior Tribunal Federal (STF) em junho

Portais de notícias e especialistas têm repercutido que a Suprema Corte dos Estados Unidos (EUA) – instância análoga ao Superior Tribunal Federal (STF) do Brasil – validou a Seção 230 do ordenamento jurídico daquele país, ao isentar as plataformas digitais Google e Twitter pelos conteúdos postados por terceiros. O dispositivo se assemelha ao artigo 19 do Marco Civil da Internet Lei n° 12 965/2014, que está em avaliação pelo STF, no julgamento de Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) que tratam do assunto. O caso americano suscita, novamente, no Brasil e no mundo, a responsabilização das Big Techs por conteúdos postados por usuários que tenham associações com práticas criminosas, como atentados terroristas e massacres em escolas.

De acordo com o advogado especialista em Direito Digital e Proteção de Dados Rafael Maciel, não houve, entretanto, essa validação da Seção 230, porque o tribunal americano sequer enfrentou o dispositivo. “A Suprema Corte afastou o caso do Twitter por não ter constatado ‘assistência substancial’ a ato terrorista, com base na Lei Anti-terrorismo e, por essa razão, entendeu que não precisaria analisar o caso do Gonzalez contra a Google, no qual se discutia a responsabilidade desta por recomendações de conteúdo no Youtube. Fugiu desse tema espinhoso com propriedade e técnica processual”, avalia Maciel.

O advogado destaca que a regulação das redes sociais é necessária, mas pontua que isso não pode vir simplesmente por uma declaração de inconstitucionalidade de um dispositivo legítimo, tal como nos EUA é o artigo 19. “Da mesma forma, entendo, não há que se dar imunidade total às plataformas. Podem não ser responsáveis pelos conteúdos, claro, porém devem ser responsabilizadas pelos atos que gerem, como a forma de distribuição dos conteúdos, se o mecanismo for enviesado”, observa. Ele acrescenta que elas devem ser mais transparentes em relação aos conteúdos que – embora não sejam responsáveis – removem, quando entendem que ferem seus termos de uso.

Segundo Rafael, o grande problema dessas decisões das plataformas está no fato de que, na maioria das vezes, elas não se preocupam com a necessidade de explicar ao usuário qual foi a violação cometida. “Elas detêm o direito exclusivo de decidir o que pode ou não ser veiculado e odeiam quando um Estado ou ordem judicial querem ‘dar pitacos’ sobre o seu negócio. Essa é a verdade” ressalta.

Marco Civil da Internet

Na quarta-feira, 17 de maio, quatro ações que discutem a questão da responsabilização das plataformas digitais sobre conteúdos postados por terceiros e estão relacionadas ao artigo 19 do Marco Civil da Internet estavam na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF). Contudo, o julgamento foi adiado para junho, conforme noticiou o Portal CNN Brasil. Segundo Rafael Maciel, o artigo 19 prevê que provedores de aplicações, tais como Facebook, Google, Tiktok, entre outros, apenas respondem civilmente quando descumprem uma ordem judicial para a remoção de conteúdo. “É possível gostar ou não do referido dispositivo, porém ele está longe de ser inconstitucional”, enfatiza.

Para o advogado, o artigo 19 não é o que precisa ser discutido agora, muito menos sob a ótica de inconstitucionalidade. “É preciso dar transparência para que os provedores possam explicar suas regras e dar mais visibilidade à forma como retiram conteúdos. É necessário que haja um equilíbrio para que os usuários possam ter mais segurança e confiança ao utilizar as plataformas de internet”, conclui.

Entenda o caso dos EUA

Conforme noticiado pelo portal G1, nesta quinta-feira, 18 de maio, o Supremo Tribunal dos EUA decidiu sobre duas ações que envolviam acusações sobre as empresas Twitter e Google de serem responsáveis pela recomendação de conteúdos terroristas em suas plataformas. Nos dois casos, Twitter v. Taamneh e Gonzalez v. Google, buscava-se responsabilizar as empresas de tecnologia por hospedarem conteúdo do Estado Islâmico que promovia a organização terrorista em conexão com ataques violentos.

De acordo com o portal TechCrunch, a Suprema Corte emitiu uma decisão unânime sobre o primeiro caso (Twitter), determinando que não houve auxílio por parte da empresa ao Estado Islâmico, quando o grupo atacou uma boate em Istambul, na Turquia, em 2017. O entendimento se estendeu à ação envolvendo a Google, que também estava sob análise da corte. Nesse caso, a família de Nohemi Gonzalez, vítima de ataques terroristas do Estado Islâmico em Paris, na França, em 2015, argumentou que o Google deveria ser responsabilizado pelo conteúdo terrorista promovido no YouTube antes do ataque.

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