Artigo de Débora Curi – Oncologista Clínica do Grupo SOnHe
Está sendo estudada uma vacina terapêutica contra o melanoma. Apesar de ser menos frequente, ele é responsável por cerca de 4% dos casos de câncer de pele e é o tipo mais temido e mais letal.
Um dos estudos é das farmacêuticas Moderna e MSD, no qual cerca de 150 pessoas que foram operadas com melanoma receberam uma vacina personalizada juntamente com um medicamento imunoterápico.
Foram avaliados apenas pacientes que haviam sido submetidos a ressecção cirúrgica de melanoma com alto risco de recorrência. Eles foram tratados de forma adjuvante, ou seja, para diminuir o risco de recorrência. O grupo experimental recebeu a vacina juntamente com uma imunoterapia que impede que os tumores escapem das células de defesa. Já o grupo controle, recebeu apenas a imunoterapia.
Uma atualização recente demonstrou que quem recebeu a vacina tinha maior probabilidade de permanecer livre do câncer 18 meses depois do que os pacientes que não receberam. Embora o estudo seja pequeno, é um primeiro passo muito importante.
Tal como a vacina contra a COVID-19 da Moderna, trata-se de uma vacina de RNA mensageiro (RNAm). Em estudos preliminares, já foi demonstrada segurança, viabilidade, respostas imunológicas robustas e, agora, o braço experimental demonstrou superioridade reduzindo em 44% mortes e recorrências por melanoma em relação ao controle. Além disso, 84 dos 107, ou 79%, ainda estavam em remissão após 18 meses, em comparação com apenas 31 dos 50 (62%) pacientes que receberam apenas a imunoterapia.
É um marco para o campo das vacinas contra o câncer, que tem lutado durante décadas com dificuldade para mostrar resultados. São dados animadores. Trata-se da primeira evidência clara de que uma vacina concebida para atingir mutações no tumor de um paciente pode prevenir o seu novo crescimento.
De forma objetiva, a vacina induz o sistema imunológico a criar células de defesa específicas contra o tumor de cada indivíduo, atuando como uma terapia personalizada e direcionada. Em paralelo, na Oncologia quando achamos uma mutação e a utilizamos como terapia-alvo, no caso da mutação do gene BRAF, por exemplo, essas mutações são compartilhadas por vários pacientes. Já no caso do neoantígeno personalizado da vacina, eles são vistos apenas naquele indivíduo.
Nesse contexto, o Food and Drug Administration (FDA), agência reguladora dos Estados Unidos, concedeu o status de “terapia inovadora” à essa vacina, reconhecendo o potencial da tecnologia e dando prioridade para sua avaliação. Isso
acelera o desenvolvimento e a revisão de medicamentos destinados a tratar uma condição grave e demonstra que as evidências clínicas preliminares indicam que o medicamento pode oferecer uma melhora substancial em relação à terapia disponível.
Existem desafios que precisam ser superados, como o tempo até a vacina estar disponível, a identificação da plataforma de vacinas mais adequada a ser utilizada, o custo de produção. Mas a expectativa é grande, visto que a ciência trouxe grandes ganhos no tratamento com a imunoterapia para diversos tipos de tumores nos últimos 10 a 15 anos e revolucionou o tratamento do melanoma.
Resta aguardar e acompanhar os novos dados que estão surgindo, solidificando o conhecimento e embasando a aprovação da estratégia pelas agências reguladoras até, então, estar disponível aos pacientes.
Débora Curi é formada em Medicina pela UNIVAS – Pouso Alegre, Residência em Clínica Médica pelo Hospital Pitangueiras – Jundiaí e em Oncologia Clínica pelo Hospital da PUC-Campinas. Pós-graduada em Nutrologia pela ABRAN. Realizou Fellow em Oncologia Clínica no Grupo SOnHe. É membro da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO) e da Sociedade de Medicina e Cirurgia de Campinas (SMCC).