Rodrigo Augusto Prando, Professor e Pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Cientista Social, Mestre e Doutor em Sociologia, pela Unesp.
Há, inicialmente, que se repudiar todo o tipo de violência, toda a agressão, seja verbal, simbólica e, principalmente, física. A política existe, em larga medida, para que os conflitos gerados no bojo de nossa sociedade sejam resolvidos por meio do diálogo, dentro das instituições e à luz das leis, da legalidade, no Estado Democrático de Direito. A violência e a coerção física legítima são monopólios do Estado e usada em situações muito específicas. Na democracia, devem prevalecer, como gostava de asseverar Florestan Fernandes, a força das ideias e não as ideias da força.
O episódio da cadeirada – entendido sob a perspectiva da racionalidade – nos levaria à uma conclusão lógica: além do processo criminal por agressão, Datena deveria ser expulso do partido e se retirar da disputa eleitoral. Não seria surpresa, contudo, se, nas novas rodadas de pesquisa de intenção de voto, Datena crescesse e Marçal possa recuperasse a força que perdeu nas últimas semanas. Novamente, Marçal, um provocador profissional, conseguiu o que queria: cortes para suas redes sociais e, quem sabe, uma diminuição de sua rejeição, que já ultrapassou a de Boulos.
Outro elemento, quando lidamos com a racionalidade, é encontrar, cientificamente, repetições e regularidades nos fenômenos. Vejamos três situações bem conhecidas: Bolsonaro foi esfaqueado; Trump foi alvejado por um disparo de fuzil; e, agora, Marçal foi agredido com uma cadeirada. Nesses casos, observa-se que o agressor de Bolsonaro foi considerado inimputável e encontra-se internado; o atirador que acertou a orelha de Trump foi morto pelas forças de segurança e a investigação prossegue; e Datena, por sua vez, afirmou que perdeu a cabeça e que não deveria ter desferido a agressão, mas que, infelizmente, o fato ocorreu e que aguardará as consequências. Com relação ao perfil dos agredidos, há semelhanças nos métodos que usam para fazer política e nos seus discursos?
Bolsonaro, Trump e Marçal, de diferentes formas, em maior ou menor grau, entendem como funcionam as redes sociais e o engajamento alicerçados sobre os sentimentos: ódio, medo e angústia são excepcionais produtores de memes, lacração e, não raro, abundam em suas falas fake news, pós-verdade, negacionismo e teorias da conspiração. Tais comportamentos são meticulosamente criados pelos “engenheiros do caos” e impulsionados pelos algoritmos das redes sociais e eletrizam uma sociedade polarizada, calcificada e dividida em grandes bolhas. Mensagens extremistas são recebidas em bolhas nas quais se encontram aqueles que compartilham os mesmos valores e ideologias políticas e são validadas pelo fenômeno do viés de confirmação.
Nesses casos, enormes grupos de opinião se formam e não estabelecem nenhum diálogo fora da bolha, ou seja, o debate público e a democracia são enfraquecidos. Mas, para além das bolhas, os discursos desses atores políticos encontram, ao que tudo indica, aqueles chamados “lobos solitários”, indivíduos sem pertencimento a grupos específicos, que, por algum motivo, racional ou não, sentem-se tocados pela mensagem transmitida e partem para a violência física, buscando eliminar o que consideram um “inimigo”.
Por fim, repudie-se todo tipo de violência. Marçal, que foi hospitalizado, que logo esteja plenamente recuperado. E que Datena seja responsabilizado pelos seus atos. Esse é um dos mais tristes capítulos de nossa história política. Será que aprenderemos algo?
*O conteúdo dos artigos assinados não representa necessariamente a opinião do Mackenzie.
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